17/05/2006

O APLICADOR

Amanhã vou ser "aplicador". Como não me deixam interpretar as instruções, para além da estranheza do nome, lá terei que me amanhar com o género do dito (conf. pág. 10 "Manual do Aplicador")!

O Manual é um monumento! Como já disse, trata os professores vigilantes da prova por "aplicadores" e, depois, manda-os ler em voz alta, aos alunos que respondem à prova, um certo número de recomendações. Começa assim:
Como já foi dito, hoje há alguns alunos e algumas alunas que frequentam o 6.º ano de escolaridade e que vão, à mesma hora, realizar esta prova (p. 21)

Para além do disparte, politicamente correcto, de referir "alunos e alunas", nesta frase há um erro de palmatória: "e que vão..." que faz ali a conjunção?

Mais abaixo, na mesma página, está escrito, para ser lido aos alunos:

Passo agora a ler os cuidados a terem ao longo da prova.

Em primeiro lugar, chamo a atenção para o facto de não poderem falar com os vossos colegas, durante todo o tempo de realização da prova. (...)

Esta moda de construir as frases sempre me deixou perplexa. Cuidados a terem? Não deveria ser "cuidados a ter"?


A mania do tratamento por você dá origem a construções estranhíssimas e erradas: não poderem falar com os vossos colegas. Eles, os alunos (sujeito subentendido tendo em conta a 3.ª pessoa usada no predicado), não podem falar com os vossos colegas???? Francamente!

Se querem continuar a perder a 2.ª pessoa do plural, façam o favor, mas pelo menos escrevam de modo a não cometer erros tamanhos!


Os mesmos erros repetem-se ao longo de todo o Manual, pelo que me abstenho de continuar a enumerá-los.

Da página 22, o "aplicador" deve ler em voz alta:

Uma outra coisa que eu tenho de vos dizer é que esta prova é muito importante, ainda que dela não dependa a vossa transição para o 3.º ciclo - 7.º ano de escolaridade. De facto, as informações que forem obtidas com esta prova vão permitir adequar cada vez mais o trabalho dos professores aos vossos conhecimentos e necessidades. Por isso, é muito importante que dêem o melhor, respondendo com calma e ponderação a todas as questões. (...)

Dizemos coisas ou dizemos, simplesmente?

Quem escreveu este arrazoado não faz a mínima ideia da competência vocabular dos garotos que vão responder à prova. De que outra forma se justifica a escolha de palavras como transição; adequação; obtenção e ponderação.

Vão ter cinquenta minutos para responderem(...),

lê-se na pág 24

(...) em caso de engano, podem sempre apagar o desenho e voltar a desenhá-lo.

Lê-se na pág. 26. Desenha-se o desenho, com certeza!

Embora houvesse mais para dizer, fico-me por aqui no que toca à Língua Portuguesa.

Vejamos outros aspectos:

  1. Os garotos não podem copiar, mas nada se diz acerca do procedimento a ter com quem o faça!
  2. Os miúdos não podem conversar, etc. mas não se refere o que deve fazer o "aplicador" nessas circunstâncias. E se o gaiato for um malcriado e começar a bater nos colegas e a insultar o "aplicador"? Lembro que o "aplicador" não pode sair da sala onde está sozinho!
  3. Diz-se que os alunos devem conferir se o material está utilizável. Onde verificarão se a caneta escreve, se têm que o fazer antes de lhes ser fornecido qualquer papel? Na mão ou na secretária?
  4. As duas partes da prova são fornecidas, em simultâneo, aos alunos que não podem, durante a 1.ª parte, ver as páginas da segunda e vice-versa, embora as tenham à frente. Que fazer com quem, num gesto de simples curiosidade, folhear toda a prova? E se, após o intervalo, corrigir uma resposta da primeira parte? Que faz o aplicador?
  5. O "aplicador", já o disse, não pode interpretar as recomendações que deve ler alto aos alunos, mas quase todas elas terminam assim: Querem perguntar alguma coisa? Estou a ser claro(a)? Confesso, na minha honestidade intelectual, que fico perplexa. Se não posso interpretar, como posso esclarecer dúvidas? Volto a ler a mesma xaropada?

Só uma nota final: Serei "aplicadora", mas o meu nível de ensino não é este. Os meus alunos é que ficam sem aulas por causa destas provas. Hoje e amanhã. Não seria mais honesto que houvesse exames a sério, depois de terminadas as aulas? Assim é uma brincadeira e eu sou a aplicadora.

Se fossem pastar grilos!

2 comentários:

Jorge P. Guedes disse...

Menina, tu és um terror! Vou passar a demorar mais uma horita a verificar as asneiras que decerto publico. Mas lá que tens toda a razão...
P.S.- Dei algum erro?!

MPS disse...

És um brincalhão!
Lá por Bragança temos uma espécie de jogo do sério que é assim:à medida que cada um vai pondo o seu, diz-se:
"um punho
um punho..." etc.
Depois de terminado o carrelo dos punhos de todos os jogadores, o último pergunta:
-"O que é isto?"
-"É uma arquinha velha!"
-"O que tem dentro'"
-"Pão bolorento!
-"E por fora?
-"Cordinhas de viola!
-"O primeiro que se rir leva uma castanhola!

Eu não sou capaz de me rir disto, mas anda alguém a rir-se às nossas custas e que parece a arquinha velha. Tem que levar uma castanhola!