29/06/2009

S. PAULO


El Greco, S. Paulo


Hoje é dia de S. Paulo. Também é de S. Pedro, porque a igreja cristã achou por bem reunir as duas pessoas numa única celebração, que é a dos fundadores dessa igreja. Entre nós, S. Paulo tem saído a perder e não me parece justo porque foi do seu labor que nasceu um cristianismo aberto a todos (outros do seu tempo queriam-no limitado aos circuncisos) e foi do seu pensamento, alicerçado na absoluta dedicação à mensagem de Cristo, que a dignidade humana foi alcandorada a alturas, antes, impensáveis:



Não há judeu nem grego;
não há escravo nem livre;
não há homem e mulher,
porque todos sois um só em Cristo.

(Epístola aos Gálatas, 3, 27-28)


A escrita de S. Paulo é poética, embora não quebre os versos. Aqui fica aquela que é, talvez, a mais bela das suas poesias - o capítulo 13 da primeira carta aos Coríntios, hoje, dia em que termina a celebração do ano paulino dedicado aos 2000 anos do nascimento do apóstolo que não conheceu Jesus em pessoa.

Ainda que eu fale as línguas dos homens e dos anjos, se não tiver caridade, sou como um bronze que soa ou um címbalo que retine. Ainda que eu tenha o dom da profecia e conheça todos os mistérios e toda a ciência e ainda que eu tenha toda a fé, de tal modo que remova montanhas, se não tiver caridade, nada sou. Ainda que eu distribua todos os meus bens e ainda que eu entregue o meu corpo para ser queimado, se não tiver caridade, de nada me aproveita. A caridade é paciente, bondosa é a caridade, não ferve de inveja, não se ostenta, não se orgulha, nada faz de inconveniente, não procura o seu interesse, não se irrita, não guarda ressentimento, não se alegra com a injustiça, mas alegra-se com a verdade; tudo suporta, tudo crê, tudo espera, tudo aguenta. A caridade jamais acaba. As profecias serão abolidas, as línguas cessarão e a ciência será abolida. Pois o nosso conhecimento é fragmentário e fragmentária é também a nossa profecia. Mas, quando vier o que é perfeito, o que é imperfeito será abolido. Quando eu era criança, falava como criança, pensava como criança, raciocinava como criança. Mas, quando me tornei homem, deixei o que era próprio de criança. Agora vemos como num espelho, de maneira enigmática; depois veremos face a face; agora conheço de modo fragmentário; depois reconhecerei como fui reconhecido. Agora permanecem a fé, a esperança, a caridade, estas três; mas a maior delas é a caridade.

(1Cor, 13)

12 comentários:

Meg disse...

Cara MPS,

Depois de ler este post, regressei à minha infância e ao meu primeiro contacto com "esta" Igreja. Numa Missão de S.Paulo, precisamente.
Sim, nesta eu acredito. E desta eu tenho saudade, muita saudade.
E mais não digo... vou reler para me reconfortar com as suas palavras.

Que bom tê-la aqui de novo!

Um abraço

Mare Liberum disse...

Congratulo-me com mais um post seu neste blogue.E que post! Já ouvi ler por muitas vezes esta epístola de S. Paulo mas hoje trouxe-me um conforto especial.
Relê-la-ei e voltarei a comentá-la.
A caridade, tal como S. Paulo a descreve, anda ausente. Muito ausente.Quando pararão as pessoas para pensar que a vida é tão só uma transição?

Bem-haja, amiga!

Um grande, grande abraço

MPS disse...

Cara Meg

Eu não conheço outra, mas acredito que a sua experiência seja diferente da minha.

Um abraço e obrigada pela sua presença

MPS disse...

Cara Isamar

Quando pararemos todos para pensar? Quando pararemos, cada um de nós, de procurar o nosso interesse?

S. Paulo é, provavelmente, o autor do livro dos Actos dos Apóstolos onde vêm narra os primórdios da vida da(s) igreja(s) cristã(s). Vale a pena ler, se o não conhece. A caridade fazia todo o sentido. Porque já não fará?

Um grande abraço e obrigada pelo incentivo

Chanesco disse...

Minha cara MPS

Bem deveria esta sociedade moderna, consumista e individualista, desprendida e egoista em que estamos inseridos, acolher estes ensinamentos.

Um grande abraço

Mare Liberum disse...

Minha muito cara MPS

Não conheço o livro que refere e procurarei lê-lo tão breve quanto possível.Tenho a certeza que será sempre uma importante mais-valia e muito maior agora no meu caso particular.Andamos voltados para interesses individuais esquecidos que o bem colectivo é o suporte anímico de cada um. Este extracto, ainda que todo capítulo seja muito importante,deve ser retido por cada um de nós e que nunca confundamos caridade com a caridadezinha mesquinha que por vezes encontramos por aí:
"A caridade é paciente, bondosa é a caridade, não ferve de inveja, não se ostenta, não se orgulha, nada faz de inconveniente, não procura o seu interesse, não se irrita, não guarda ressentimento, não se alegra com a injustiça, mas alegra-se com a verdade; tudo suporta, tudo crê, tudo espera, tudo aguenta. A caridade jamais acaba."

Bem-haja por tudo quanto tenho recebido.

Um grande, grande abraço

MPS disse...

Caro Chanesco

A caridade dá muito trabalho e consumir é tão fácil...

Um grande abraço

MPS disse...

Cara Isabel

Reparei que transformei em quase certeza, aquilo que é uma discussão entre teólogos: a autoria do Livro dos Actos. Este livro começa assim: "No meu primeiro livro, ó Teófilo...". Identifica-se, habitualmente, esse "primeiro livro" como sendo o Evangelho de S. Lucas, ou seja, S. Lucas seria o autor dos dois. Mas depois vem a crítica interna e percebe-se a total associação de pensamento entre o autor do terceiro evangelho e dos Actos e o próprio S. Paulo das Cartas. Daí, então, a convicção de muitos de que, se as obras não são de S. Paulo são por ele ditadas ou, pelo menos, de inspiração paulina. S. Lucas costuma identificar-se com o médico Lucas, um dos companheiros de S. Paulo que o terá acompanhado, até, à prisão em Roma.

Desculpe este intróito tão longo, mas precisava de esclarecer a afirmação que fiz no comentário anterior.

O Livro dos Actos dos Apóstolos é o quinto livro do Novo Testamento (vem logo a seguir ao Evangelho de S. João) e o que o torna admirável, mesmo aos olhos dos não crentes, é o espírito de partilha, entreajuda e comunitarismo existente nas primeiras comunidades de cristãos. entre isso e a "caridadezinha" não há a menor semelhança. A "caridadezinha" é um pecado!

Um grande abraço

Meg disse...

MPS, minha Amiga,

Fugi por momentos desta loucura do Verão, para saber de si, agora que, mais do que nunca se tropeça no mais vil consumismo de alguns, num lugar de mentira e faz-de-conta.
E por aqui, me deixo andar, nesta pausa breve, visitando os amigos.
Esquecendo-me do resto...

Um abraço grande para si... e que o Verão que a mim me queima, a si lhe aqueça a alma... aos poucos.

Um abraço

Anónimo disse...

Acho muito injusto tudo o que se refere a São Pedro que é o mais humano dos Apóstolo. Jamais Paulo, com toda a sua intolerância e contexto de vida, o ombreará. A Igreja tem muito para aprender com São Pedro, «o Escolhido por Jesus» e a desaprender com Paulo que serviu para os concíclios e as hierarquias. Cuidado com o que se esconde na sombra de Paulo. Quem já leu a sério a vida de Paulo, mesmo a sério e tudo, mas mesmo tudo, o que escreveu?

MPS disse...

Miha cara Meg

Tenho andado tão fugida de tudo! Agradeço-lhe, profundamente, as suas palavras carinhosas. Por enquanto mantenho-me na "minha" serra onde as dificuldades de comunicação vão servindo de pretexto para a fuga ao tempo. Não tardará terei que regressar e prometo visitá-la com a disponibilidade que merece.

Um abraço

MPS disse...

Caro anónimo

Partilhamos o carinho por S. Pedro, o mais humano dos apóstolos por ser aquele de quem melhor se conhecem as fraquezas. Foi escolhido por Cristo, sim, como cada um dos outros onze a quem chamou pelo nome (falando em termos históricos porque, em termos de fé, também o chama a si e a mim, a cada um pelo seu nome).

Li tudo quanto S. Paulo escreveu e mais aquilo que tradicionalmente lhe é atribuído e que a moderna crítica bíblia duvida que tenha saído do seu penssamento: por exemplo, a Carta aos Romanos.

S.Paulo é o fundador da igreja como a conhecemos, aberta a todos os Homens, sem distinguir ninguém. No seu tempo isso foi uma ousadia enorme que só tem comparação com a própria ousadia de Jesus. S. Pedro era mais limitado sob ese ponto de vista. Para ele, só poderia ser cristão quem seguisse os ritos judaicos. É todo um mundo a separá-lo de S. Paulo. Felizmente para o mundo inteiro, historicamente saiu vitoriosa a opção de S. Paulo, permitindo que os valores de Jesus fossem levados a toda a Humanidade.

Não há que temer S. Paulo, porque não há que temer Cristo. Há, isso sim, que ler S. Paulo e entendê-lo devidamente já que,do mesmo modo que Cristo não tem culpa dos cristãos, S. Paulo não tem culpa dos "paulistas".

Grata pelas suas palavras de discordância, já que acredito firmemente que é da discussão que nasce a luz.